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Investidor, cuidado com o risco que você nem sabe que está correndo
Por Fernando Camargo Luiz (*)
Sabendo o que você sabe hoje, você teria emprestado seu dinheiro para as Lojas Americanas ou para a Light? Saiba que apesar de você entregar este trabalho importante relacionado ao seu patrimônio para gestores de fundos, pode ter emprestado e nem tinha conhecimento disso. E estes gestores ainda ganharam dinheiro por fazerem isto e só você perdeu.
Seu patrimônio também pode estar exposto a outras várias empresas que estão prestes a dar calote, fraude ou problemas financeiros e você nem sonha. Mas como? Simples, se você investe em fundos com crédito privado corporativo está exposto a esse risco, sem ao menos entender os incentivos que os gestores possuem para pegar o seu dinheiro e entregar a estas empresas. Inclusive com a regulamentação permitindo isto em fundos ditos conservadores. E o pior é que este tipo de investimento é vendido pelo mercado como uma renda fixa qualquer e para investidores considerados conservadores. Sim, isso mesmo.
De um tempo para cá, o risco do sistema vem aumentando com a manutenção da taxa básica de juros (Selic) em patamar elevado e ainda com risco de novas altas: o cenário está piorando. Os números de pequenas e médias empresas em recuperação judicial desde a última eleição nunca esteve tão alto e os bancos estão abrindo mão de operações de crédito com estas empresas e repassando para fundos …. que captam o seu dinheiro para emprestar para elas. Ou seja, operações que não servem para os bancos, mas servem para você!
Para se ter uma ideia, somente no mês de julho, o Indicador de Falências e Recuperação Judicial da Serasa Experian registrou um total de 228 empresas que entraram com pedidos de recuperação judicial, 29% a mais do que no mês anterior e mais do que o dobro (123,5%) dos registros de um ano atrás. Este é o maior número de 2024 e o mais alto registrado na série histórica, que teve início em 2005. Nos primeiros sete meses deste ano, os pedidos somam 1.242.
Nesses números, não temos apenas as pequenas e médias empresas, mas gigantes, como a Polishop, Coteminas, SideWalk, Casas Bahia, Supermercados Dia e por aí vai. O fato é que as dívidas milionárias dessas empresas não se limitam a fornecedores, mas também a obtenção de financiamentos de capital de giro junto ao mercado. E isso passa pelos fundos de investimento, sejam os tradicionais multimercados ou os específicos FIDCs, que começaram a entrar neste tipo de ativo, quando as estratégias tradicionais pararam de funcionar. Só olhar o retorno dos fundos multimercados tradicionais nos últimos 24 meses e ver a mudança no discurso, muitos deles falando que estão entrando no segmento de crédito.
Muitos fundos de renda fixa, ditos conservadores, também contêm crédito privado corporativo em seus portfólios, que nada mais são do que dívidas com empresas. A própria regulamentação permite que fundos conservadores tenham até 20% do seu patrimônio neste tipo de ativo arriscado, você sabia disso? Então, os agentes de mercado, gerentes de bancos esquecem de contar este pequeno detalhe quando colocam seu dinheiro nesses fundos.
Cobra-se uma taxa de juros para emprestar o dinheiro e daí é que vem a rentabilidade do fundo que você acompanha mês a mês. Enquanto a empresa está honrando o compromisso, os ganhos estão garantidos, mas lembre-se: o risco de crédito é binário, ou seja, é ganha ou perde. Se a empresa entra em recuperação judicial e não tem condições de honrar os compromissos, é o seu patrimônio que estará em jogo. E o gestor, continua coletando a taxa de gestão dele, mesmo quando o fundo perde dinheiro emprestando para empresas com problemas. Isto só é um problema quando você, cotista do fundo, não sabe direito que riscos está assumindo antes de colocar seu dinheiro lá.
Quando falamos de FIDCs, sigla para os Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios, a questão é mais complexa ainda. Recentemente liberados pela CVM para que as pessoas físicas invistam, tais fundos são focados totalmente em dívida corporativa privada. Como o próprio nome sugere, o objetivo aqui é comprar o direito ao crédito (recebimento futuro) com uma taxa de desconto que proverá a rentabilidade do investidor que adquiriu o papel.
Por conta da desintermediação do crédito e dos bancos muito inteligentemente permitindo esta liberação, tais fundos buscam oferecer uma rentabilidade acima da média do mercado, o que os torna atrativos por este prisma. Mas e o risco para isto ser verdade? Vale a pena arriscar seu patrimônio por um percentual um pouco maior que o CDI? Quais os títulos que compõem o FIDC que você pretende investir? Qual a situação financeira da empresa devedora? Quem está fazendo este trabalho de análise destes fundos profundamente, de forma a resguardar seus interesses como cotistas? Eu respondo: quase ninguém.
Claro que os gestores de fundos fazem uma análise das empresas que vão compor o portfólio, mas o balanço das Americanas era auditado e ninguém imaginava o que ia acontecer no fatídico janeiro de 2023. Além disso, um mal devedor pode aumentar a taxa que paga pelo crédito, dando a falsa impressão que o fundo está indo muito bem, sendo que na prática, o fundo credor está assumindo muito mais risco do que o necessário com o seu dinheiro. Para o gestor, enquanto a empresa estiver pagando, ele continua coletando sua taxa de gestão, mas se der algo errado, o problema na prática é somente seu.
Quem atua nesta área também fala de pulverização de riscos, ou seja, que o fundo não estará exposto a poucos ativos e poucas empresas. Assim, se uma deixa de pagar a outra compensa. Cuidado, não é tão simples assim. Nos últimos 3 anos diversos gestores e fundos de crédito literalmente quebraram mesmo tendo uma carteira pulverizada.
O fato é que sempre que falamos em investimento, o risco vem na frente da rentabilidade. Quantos não pensaram em ganhar mais e acabaram vendo o dinheiro virar pó? Pergunte-se se sua carteira está de acordo com o risco que você quer tomar. Para isto, é preciso, então, definir o que é risco. De forma simples, risco é aquilo que pode acontecer depois que já pensou em tudo. Assim, entender para onde seu dinheiro está indo de fato é parte fundamental da sua decisão de alocação. Se não tiver esta informação, não faça o investimento.
No final é o cliente que não entende como o mercado repassa seus riscos que acaba tomando todo o risco de crédito das más operações que os fundos fazem. E claro, sem ganhar o prêmio por estar assumindo este tipo de risco, porque todo mundo na cadeia precisa antes tirar o seu. Cuidado, no mercado financeiro, se você não sabe quem é o pato, é porque o pato é você.
(*) Fernando Camargo Luiz é gestor da Trópico Investimentos