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Brasil deixa de arrecadar ao menos R$ 6 bilhões por ano com ida de estudantes ao exterior para cursar medicina, segundo estimativas da AMIES
Argentina, Paraguai e Bolívia contam com cerca de 65 mil estudantes brasileiros
Cada vez mais brasileiros têm buscado faculdades no exterior, em países como Argentina, Paraguai, Bolívia e até a Rússia, para realizar o sonho de cursar medicina, sobretudo devido aos altos custos das faculdades particulares no Brasil e esse movimento tem gerado um grande impacto ao país. De acordo com estimativas da AMIES (Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior), o Brasil deixa de arrecadar pelo menos R$ 6 bilhões por ano com a evasão dos estudantes.
Esse valor é calculado de acordo com o valor médio de um curso de medicina ao longo dos seis anos da graduação, que em 2022 era de R$ 684 mil, além de impostos e taxas – também entram na conta as bolsas de estudos, demais descontos concedidos a estudantes de baixa renda e o aumento das vagas nos últimos anos, o que tem gerado um equilíbrio maior nos cursos das mensalidades.
Segundo dados do Ministério das Relações Exteriores (MRE), cerca de 65 mil brasileiros estudam medicina nesses três países da América Latina – número que representa mais de um terço do total de alunos de medicina que estudam no Brasil.
O valor das mensalidades praticados no Brasil, que podem passar de R$ 10 mil, e a enorme concorrência por vagas são alguns dos motivadores que levam candidatos para estudar fora.
Para Nésio Fernandes, médico formado em Cuba e ex-Secretário de Atenção Básica no Ministério da Saúde, a expansão na oferta de cursos e vagas de medicina em países da América Latina tornou-se um mercado. “Hoje existem empresas brasileiras especializadas em levar estudantes para cursar medicina em países da região, principalmente no Paraguai e na Bolívia”, afirmou.
“Antigamente, era muito natural que pessoas bem-sucedidas estudassem medicina e fizessem especializações no exterior. Na última década, vimos o aumento de cursos de medicina no Brasil em universidades particulares, porém os valores são muito expressivos, o que impediu o acesso dos setores mais populares. Dessa forma, muitos viram as faculdades da América do Sul como uma alternativa”, pontuou.
Esse é o caso da Kamilla Clara Pinheiro, que iniciou o curso de medicina na Argentina e também estudou em uma universidade do Paraguai. Para Kamilla, a oportunidade de estudar no exterior foi determinante para que ela pudesse realizar o sonho de ser médica.
“Quando externei pela primeira vez minha vontade de cursar e estudar medicina para minha mãe as minhas possibilidades eram poucas: apenas faculdades públicas. Quando começamos a investir e a me dedicar ao sonho de ser médica, também começaram as pesquisas das melhores faculdades e em qual lugar teria mais vagas. Lembro que em várias pesquisas a Universidade Federal de Buenos Aires (UBA) sempre se destacava. Desde aquela época a UBA era, e continua sendo, uma das melhores Universidades da América Latina, então uma chama se acendeu”, comentou.
“Depois de muita luta e muitas tentativas sem sucesso de passar em uma universidade pública no Brasil, decidi ir para a Argentina em 2017 começar a minha jornada. Ao chegar na Argentina, me deparei com centenas de brasileiros que foram estudar fora pelos mesmos motivos que eu: alta concorrência e custos das mensalidades no Brasil”, destacou.
A estudante ressalta que na Argentina e no Paraguai não há um vestibular para medicina e sim um curso preparatório básico em que você precisa ser aprovada para ingressar na faculdade. No curso, são ministradas aulas de química, física, biologia, ciência e anatomia, além de aulas de espanhol com provas escrita e oral.
Recentemente, Kamila conseguiu uma transferência para o Brasil e atualmente cursa medicina na Universidade Estácio, localizada no município de Alagoinhas, na Bahia.
Os brasileiros formados em medicina no exterior necessitam ser aprovados no Revalida, exame aplicado desde 2011, para poder exercer a profissão no Brasil. Para Nésio Fernandes, os altos índices de reprovação ocorrem porque o exame precisa ser mais equilibrado e avaliar as competências de uma forma mais justa.
“Acredito sim que precisamos ter mecanismos de revalidação do diploma, mas você não pode cobrar de um médico recém-formado conceitos e práticas de quem atua em uma determinada especialidade há anos”, reforçou. “É necessário aperfeiçoar metodologicamente o processo de revalidação do diploma, com provas práticas e teóricas com um nível técnico compatível, além da realização da complementação dos estudos no Brasil. Até o serviço civil obrigatório complementar à revalidação poderia voltar a ser discutido. É preciso pensar a revalidação no debate pedagógico e no interesse da saúde pública, isso descontamina o debate com vieses de mercado”, concluiu.
No exame Revalida de 2022, a taxa de aprovação foi somente de 3,75%, a menor em toda a história do exame. Cerca de 96% dos candidatos foram reprovados na primeira ou na segunda etapa e, portanto, não podem exercer a profissão. Já na edição de 2023, cerca de 10% dos candidatos foram aprovados.
O Brasil conta com 379 cursos de Medicina em funcionamento no país, sendo 121 em universidades públicas e 268 em universidades privadas. São 41.805 vagas de medicina disponíveis, sendo 9.725 no ensino público e 32.080 no ensino privado.
E esses números ainda podem aumentar, já que existem 184 pedidos em tramitação no MEC (Ministério da Educação) para abertura de novos cursos de medicina, além de 110 pedidos para abertura de mais vagas em cursos já existentes.